sábado, 7 de setembro de 2013

CORPO EXPEDICIONÁRIO PORTUGUÊS (C.E.P.) A FRANÇA 1917-18

UM DIA SEM OCORRÊNCIAS

Terra de Ninguém (Colecção particular)


O que é que se vê da 1.ª Linha? Coisas pavorosas durante a noite, quando a lua ou os "very-light" iluminam a Terra de Ninguém. À frente do parapeito, a rede de arame farpado; um verdadeiro inferno inventado pelo diabo para não deixar descansar o soldado. Todas as noites era preciso consertá-lo; todas as noites o inimigo cortava um pedaço.

Na Terra de Ninguém
(Colecção particular)
Uma noite, ao "a postos", seis granadas caiem em diversos pontos, à frente e à rectaguarda, mas muito próximo da 1.ª Linha; aquela hora, era para dar que pensar. Os homens recolhem aos abrigos, apenas as sentinelas e o oficial de serviço ficam nos seus lugares, porque estes homens têm de manter-se nos seus postos, ainda que a trincheira vá pelos ares.

A seguir, começam a chover granadas sobre o abrigo do comandante da companhia na razão de uma por segundo. Pelo ar voavam destroços de madeira, de arame, terra...latas de conserva, estacas, etc., etc.

Neste inferno, para se fazerem ouvir, os oficiais gritavam furiosamente as ordens aos ouvidos dos homens, como se lhes fossem morder as orelhas. O comandante da companhia quer comunicar com o do batalhão: impossível; estão as ligações rebentadas. Manda uma ordenança com um pedaço de papel onde à pressa escreveu:- «violento bombardeamento sobre a 1.ª Linha e trincheiras de comunicação. Tudo recolheu aos abrigos».

Máscara anti-gás modelo P de
1915 (inglês) utilizado pelo CEP
(Colecção particular)
Observa-se o momento em que o inimigo alonga o tiro; nesse momento está toda a gente no parapeito, que o Boche deve atacar. Os subalternos correm para a linha, as granadas continuam chovendo nela; sentiu-se uma primeira baforada de gás, e os subalternos gritam aos homens para que ponham as máscaras. E então nota-se - caso notável - que o bombardeamento não aterroriza os homens na 1.ª Linha, como se poderia supor,e que, pelo contrário, permanecem mais enérgicos, mais cheios de vida, com os nervos tonificados como ao ouvir uma bela orquestra tocando uma música emocionante.

A nossa artilharia, sempre pronta, começara a responder havia já um quarto de hora; mas o estrondo das granadas inimigas em torno da nossa gente era tal, que não deixava perceber que a nossa artilharia fazia já fogo, e que as nossas granadas faziam voar o inimigo para fora das suas trincheiras.

(Colecção particular)
O bombardeamento contrário incidia particularmente num ponto do parapeito, numa frente do pelotão, e o comandante da companhia mandou concentrar os seus homens, à excepção das sentinelas, próximo de um dos flancos da porção bombardeada, todos com máscaras, baioneta armada, prontos a contra-atacar; as metralhadoras apontadas à brecha. Alguns homens caiem; os maqueiros prontamente os transportam para a rectaguarda, para o posto de socorros.

De súbito, parou o bombardeamento, embora persistindo mais para os flancos. A metralhadora do nosso lado direito cessou de funcionar, a sua guarnição caíra toda e o inimigo aparece no parapeito; a esta vista, o pelotão concentrado num dos flancos, rompe fogo; os alemães surpreendidos, recuam; o comandante do pelotão salta para o parapeito e atrás dele os seus soldados que caiem sobre o inimigo que rola para a Terra de Ninguém.
Soldados alemães ao ataque. (Colecção particular)

Os nossos soldados descarregam as espingardas sobre eles: chovem granadas, batem-se à baioneta com os alemães os soldados do 34: mais para a direita, sobre o monte de ruínas do parapeito esburacado pelas granadas combatem à baioneta os soldados do 34, do 15 e do 13... outros militares acodem e o inimigo desaparece...
Obuses alemães (Colecção particular)

O bombardeamento, agora, incidia feroz sobre as nossas baterias; uns poucos de abrigos de peças estavam esborrachados, as guarnições soterradas; noutros, os artilheiros continuavam aos pulos, furiosos, como demónios, carregando e despejando as suas peças. E o fogo aumentava de intensidade; os comandantes de bateria activavam o remuniciamento, não fossem faltar munições quando eram precisas.
Artilheiros portugueses (Colecção particular)

Na frente fizera-se a calma, e os maqueiros levantavam e transportavam os feridos e mortos. Os comandantes de pelotão tomavam nota das perdas e das reparações a fazer. O Brigadeiro veio logo às linhas saber o que se passara.

Quando os telegramas publicados nos jornais diários dizem: 
- «Sossego em toda a frente»,
o bom cidadão que lê o "Diário de Notícias" ao mesmo tempo que sorve o seu café com leite matinal, diz consigo ou para a família:
- «Estes diabos da tropa sempre têm uma sorte!»
(Colecção particular)

O que este bom burguês-amigo ignora, é que o «sossego em toda a frente» dos telegramas significa uma noite com um ou dois incidentes, como o que acabamos de narrar, com pouco relevo; é que esse «sossego» , que põem o cidadão tão desdenhosos para connosco, representa uns mínimos de 8 a 10 mortos e 30 a 40 feridos! 

In: A Grande Batalha do CEP pelo General Gomes da Costa.

Coordenação do texto e imagens: marr

1 comentário:

  1. Marramigo

    Grande blogue! Dá gosto visita-lo. Para quem gosta de História, como é o meu caso, vir aqui é uma maravilha! Muitos parabéns. Fiz cinco anos de tropa como oficial miliciano e não estou arrependido. Depois, conto.

    Já te sigo e vou colocar imediatamente o teu blogue nos meus BLOGUES MAIS FIXES... E como amor com amor se paga... :):):)

    Abç

    Henrique

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